domingo, 31 de julho de 2011

Quem não quer o Estado da Palestina nas fronteiras de 1967?


29/07/2011

Nathaniel Braia - Jornalista e escritor

De uma coisa eu tenho certeza: o Fatah não imaginava que a proposta de estabelecimento do Estado Palestino Já!, iria gerar tanto debate no Brasil.

É claro que tese da justeza do estabelecimento desse Estado é consenso mundial, mas, como toda grande causa, sempre vai gerar debates apaixonados em torno de sua aplicação concreta e é bom que assim seja.

De um lado a direita israelense que – sem nenhum espaço para contestar esse direito reconhecido mundialmente – diz que concorda com o Estado Palestino mas, desde que cercado pelo muro do Apartheid, subtraído dos territórios que já consideram anexado a Israel, com os assentamentos (nome consensual, mas que seriam melhor qualificados se denominados covis de fanáticos religiosos) com 500 mil habitantes judeus dentro deles.

Este Estado oferecido, em tese, por Israel, seria separado, também, por tropas israelenses, do rio Jordão e sem conexão independente entre Gaza e Cisjordânia e ainda sem domínio independente sobre o tráfego no mar ou no ar. Seria um Estado sem Jerusalém como capital (pois essa seria, sei lá por que cargas d’água ou direito-bíblico-religioso-judaico, ‘indivisível’). Aliás este foi o “Estado Palestino” oferecido pelo cínico Ehud Barak e rejeitado por Arafat, após o falecimento de Itzhaq Rabin. A partir daí tome-lhe artigo sionista, reproduzido na mídia ocidental, dizendo que ao declinar deste Estado-bantustão, “Arafat rejeitou o acordo de paz”.

Temos, do outro lado, os chamados ultra-esquerda, os radicais de postura – por que o verdadeiro radical, como diz o nome, vai na raiz das questões e não procura aparentar radicalidade fora da realidade concreta, e sim busca resolver os problemas, encarar as questões como elas se apresentam e podem evoluir, de fato, rumo a um estágio histórico mais favorável aos interesses da Humanidade – que contestam a proposta da OLP de Estado Palestino Já! nas fronteiras de 1967.

Acho que essa questão ainda não foi suficientemente bem abordada e por isso, tomo a iniciativa de dispor de parte do meu tempo e dos que venham a ler este artigo, para tentar acrescentar ao debate.

Primeiramente, cabe analisar a postura dos rejeccionistas entre os palestinos e apoiadores; os que se recusam a aceitar os Acordos de Oslo que foram bancados pela direção da OLP e pela maior liderança palestina, Yasser Arafat e ainda pelo conjunto do povo palestino em Gaza e Cisjordânia.

Antes de Oslo, não havia Autoridade Nacional Palestina mundialmente reconhecida, como há hoje. Apesar da Declaração de Independência da Palestina haver sido formulada em 1988, a sua governança, exercida através da OLP, estava abrigada na capital de outro país, em Túnis, capital da Tunísia, depois que a direção palestina foi ameaçada de destruição física em Beirute, por ataques israelenses, em 1982.

Até o reconhecimento da Autoridade Nacional Palestina, nos territórios ocupados, os partidos e organizações palestinas eram proibidos. Considerados organizações terroristas (nós, que fundamos uma organização revolucionária em Israel e nos territórios ocupados, a Aliança Comunista Revolucionária, que possuía em seus quadros israelenses [árabes e judeus] e palestinos da Cisjordânia, tínhamos que realizar reuniões secretas nestes territórios. Alguns dos nossos companheiros pagaram com anos na prisão a ousadia de participarem de encontros – contatos proibidos e considerados atos de espionagem por lei israelense - com integrantes de organizações como o Fatah e Frente Popular Democrática de Libertação da Palestina – FPDLP, dirigida então por Nayeef Hawatmeh, onde a questão da alternativa dois países para dois povos começou a ser debatida e construída).

Antes de Oslo, não somente a bandeira palestina era proibida de ser hasteada como até obras de arte utilizando as cores palestinas (vermelho, preto, branco e verde) também o eram. Um pintor palestino foi preso por expor um quadro seu que representava uma fatia de melancia com exatamente estas cores: o verde - a casca; o branco e o vermelho - miolo e o preto - os caroços!

Com o acordo de Oslo muita coisa mudou. Fico aturdido de ver companheiros bem intencionados deixarem de perceber o que significou em termos de avanço para a causa palestina e para o povo palestino a entrada de seu líder, Yasser Arafat, em Ramalah para ocupar as edificações da sede do governo palestino, a célebre Mukata.

Fico impressionado pelos companheiros não perceberem a importância para o avanço da causa palestina, de fortalecimento do orgulho nacional, de verem sua bandeira nacional hasteada em solo pátrio e de verem as tropas israelenses recuando e retirando-se de Ramalah, Jericó, Belém, Gaza, o que ocorreu após Oslo.  

As negociações previam a retirada por partes. Primeiro a chamada Zona A e depoism, sucessivamente a C e a D. Os acordos de Oslo também reconheceram a soberania palestina sobre os territórios ocupados que iam sendo liberados.

As medidas de Rabin foram crescentemente apoiadas pela população israelense e ele caminhava para se tornar uma liderança cada vez mais reconhecida em Israel com respaldo suficiente para avançar na implementação da solução dos dois Estados, pelo lado israelense. A direita não viu alternativa senão assassiná-lo. O fez exatamente após um comício em Tel Aviv onde, junto com mais 500 mil pessoas, acabara de entoar a música Eveinu Shalom Aleichem – Trouxemos a Paz a Vocês.

Foi o único dirigente israelense a ser assassinado e por um judeu. Como podem então os companheiros que se dizem radicais fazer tal contorcionismo mental e dizer que Rabin fortalecia a direita? Será que os companheiros radicais é que são capazes de perceber os interesses da direita israelense de forma mais clara do que ela própria, que o assassinou? De fato é muito interessante...

Por que então, meus amigos, se os acordos de Oslo fortaleciam tanto a direita, a primeira declaração de Sharon (o carniceiro de Sabra e Shatila), ao chegar ao poder, foi de que tais acordos estavam considerados nulos?

Por que então, mais uma vez, a direita israelense ameaça anular o que restou destes acordos agora que os palestinos se preparam para levar o pedido de reconhecimento do Estado Palestino à ONU? Sinceramente, uma situação ímpar, em que as idéias da direita e as dos ditos radicais de esquerda coincidem com estarrecedora sintonia...

Mas, vamos um pouco adiante. A decisão de admitir um acordo em torno do conceito de dois Estados foi bancada pelo próprio Arafat que, no Congresso Palestino, realizado ainda no exílio – como relata Alan Hart, em sua biografia sobre Arafat – conversou com cada delegado até obter uma maioria significativa.

Foi essa proposta que permitiu a abertura de negociações com os governos israelenses e o apoio oficial de dezenas de governos as justas reivindicações palestinas.  

Este conceito-proposta, além de elevar o reconhecimento mundial da OLP, mudou o curso da discussão política dentro de Israel. O discurso de que “os palestinos e os árabes querem destruir Israel”, com o qual a direita abafava todo o debate interno em torno dos direitos palestinos e garantia a maioria para suas propostas ruiu. Aliás, principalmente para os companheiros que se dizem adeptos do pensamento marxista, vale ressaltar que é a luta de classes que move as sociedades. Neste sentido, favorecer o amortecimento destas contradições e levando uma parte significativa da classe trabalhadora israelense a servir de exército de apoio e colaboração ao colonialismo é, a meu ver, desastroso e, pelo lado inverso, deslocar os trabalhadores israelenses dessa esfera e aproxima-la dos progressistas dentro de Israel é fundamental para o avanço das idéias justas na região.   

É evidente que um conflito que pode ser vendido internamente como uma defesa contra a destruição do país é um maná para abafar as contradições internas e colocar sob o tacão da ideologia mais retrógrada as consciências dos trabalhadores judeus em Israel. Eu lembro do momento em que ocorreu o ataque do Setembro Negro aos atletas israelenses em Munique. Pela primeira vez, desde a fundação do Estado de Israel, uma greve operária, no caso a dos portuários de Ashdod, colocava dos dois lados da trincheira e em oposição aberta – com relação a questões sindicais - de um lado os trabalhadores israelenses e de outro o governo. A greve ia entrar no segundo mês e já mobilizava amplos setores da sociedade israelense em seu apoio. Pois bem, no dia seguinte à notícia da morte dos atletas israelenses, o comando de greve de Ashdod suspende o movimento e declara que o faz em homenagem aos mortos em Munique.

Esse é apenas um exemplo para reflexão...

E hoje? Temos um quadro em que, como muitos já sabem, a ultradireita israelense conseguiu empalmar o poder e as forças políticas que advogam o acordo com os palestinos estão em minoria dentro do Knesset (parlamento israelense). Os assentamentos estão sendo financiados e construídos a rodo. Transportes para os assentamentos são subsidiados e os mais baratos do país. Os planos de construção de mais moradias são aprovados um após o outro. Expulsões e demolições de casas estão em alta. Os postos policiais-militares multiplicaram-se na Cisjordânia, tornando a vida dos palestinos um inferno, ataques e destruição de plantios palestinos são cada vez mais freqüentes e, como denuncia o nosso manifesto, as prisões israelenses estão abarrotadas de patriotas palestinos.

Diante disso, desse quadro claramente desfavorável para a população palestina, não fica mais do que evidente que as opções colocadas são, de um lado o estabelecimento do Estado Palestino Já!, e do outro o recrudescimento do avanço do colonialismo israelense no sentido de piorar ainda mais as condições de vida do povo palestino, um aumento das provocações para gerar tensão que justifique mais agressões e prisões nos territórios ocupados e ainda dificultar a atuação da Autoridade Nacional Palestina.

Por fim, quando a OLP coloca claramente a reivindicação do Estado Palestino Já! e especifica que isso se dará com base nas fronteiras de antes de 1967, ela, longe de ser uma ‘traição’ à causa palestina como querem alguns, permite aos progressistas no mundo inteiro e mesmo dentro de Israel carrear o máximo possível de apoio a este reconhecimento.

Além disso, como já afirmei em correspondência anterior, sem essa definição de fronteiras não faria nenhum sentido ir à ONU reivindicar o reconhecimento do Estado Palestino.

Além disso, e de forma muito inteligente, tanto o secretário-geral do Fatah, Marwan Barghoutti, como o presidente da ANP, Mahmoud Abbas, vincularam esta luta à chamada Primavera Árabe, conclamando os palestinos e os cidadãos de bem no mundo inteiro a lotarem as ruas de todas as capitais com bandeiras palestinas.

Essa jornada e o apoio que ela acarretará, juntamente com a vitória desta propositura na ONU, tornaram o Estado Palestino um fato político sem retorno, permitirão aos palestinos a participação em todos os organismos internacionais e ainda farão dos israelenses de ocupantes de território palestino a ocupantes de território de um Estado reconhecido mundialmente. As medidas internacionais, de sanções econômicas, boicote, iniciativas de isolamento político ganharão força e legitimidade maior do que já possuem, poderão ser institucionalizadas e propostas em parlamentos, universidades, entidades de massa, governos e organismos internacionais. Enfim um momento histórico para a causa deste sofrido povo e para toda a Humanidade que ao vencer mais esta etapa da luta contra o colonialismo ganha força para aproximar o imperialismo de sua derrota, que se aproxima quando seus esbirros sofrem reveses como aconteceu no Vietnã, no Apartheid Sul Africano, nas lutas de libertação nacional dos países africanos e está acontecendo hoje na Líbia.

Não é por acaso que o governo da direita fascista israelense decidiu colocar em campo suas tropas de diplomatas para tentarem fazer com que a proposta palestina tenha a menor receptividade possível em termos de votos na ONU!

Por último, nada disso impede que, uma vez estabelecido o Estado Palestino, os palestinos que hoje vivem em Israel, principalmente os moradores do chamado triângulo, predominantemente na Galileia, reivindiquem, num momento de paz futuro, sua integração a um Estado Palestino progressista ou, ainda, que venha a se formar uma federação englobando os dois Estados, uma vez superado o ódio construído pela direita israelense ou qualquer outra solução que a história e a consciência das populações locais permitir. Agora cabe sair do impasse e fazer recuar a pilhagem colonialista.

É agora! 

O avanço só pode ser conquistado quando se tem clareza do caminho a seguir e das propostas que mais atraem apoio para o lado das forças do avanço e mais isolam as do atraso. Mesmo com todas estas evidências, quem quiser se contrapor a tudo isso e, em seu lugar, colocar uma proposta que desconhece a consciência acumulada mundialmente, a correlação de forças no local da batalha e, portanto, prima pelo irreal e pelo idealismo e, ainda assim, continuar se dizendo “progressista” que o faça. Como sempre, e ainda mais numa questão que apaixona multidões, como é a causa palestina, a história vai julgar...

Da nossa parte, vamos à luta e a vitória! A amplitude das assinaturas de partidos e entidades obtidas nesta primeira fase são um grande passo para que o Brasil dê a sua importante contribuição! Viva o povo palestino! Pelo Estado Palestino Já!




sexta-feira, 29 de julho de 2011

Comitê criado para avaliar práticas de Israel na Palestina faz primeira visita em 40 anos


Comitê criado para avaliar práticas de Israel na Palestina faz primeira visita em 40 anos

28 de julho de 2011 · Notícias

 ONU - Brasil     





O “Comitê Especial de Investigação das práticas de Israel que afetam os Direitos Humanos do Povo Palestino e outros Árabes Vivendo nos Territórios Ocupados desde 1967″ pôde, pela primeira vez, depois que foi criado em 1968,  visitar Gaza. O Governo do Egito facilitou a visita através da fronteira de Rafah.

“Infelizmente, o que descobrimos foi que as restrições opressivas impostas sobre Gaza por Israel têm o efeito de punir coletivamente a população,” observou o Comitê: “Com cerca de 35% da área de Gaza excluída da agricultura, (…) o povo de Gaza não pode se alimentar, muito menos reaquecer uma economia dizimada por meio de exportações. Estamos alarmados com as alegações de que Israel impõe essas políticas empregando o uso de armas de fogo, inclusive, em alguns casos, contra crianças e idosos.”

“O contínuo bloqueio de Israel em Gaza viola os direitos humanos do povo de Gaza e as leis e padrões do Direito Internacional Humanitário,” disse o Embaixador Palitha Kohona, Presidente do Comitê. “Isto é opressivo, reduz a vida do povo de Gaza e deve acabar agora,” frisou.

As políticas e práticas do Governo de Israel que violam os direitos das crianças palestinas foram um tema constante durante todas as audiências do Comitê. Testemunhas e funcionários relataram que o acesso das crianças palestinas à educação está comprometido devido, entre outras fatores, às restrições à liberdade de circulação, de acesso e à falta de escolas, especialmente em Jerusalém Oriental e na Faixa de Gaza, bem como ameaças e violência reais por parte dos colonos israelenses. A atenção do Comitê voltou-se para o grande número de crianças detidas e uma série de práticas preocupantes, incluindo duras técnicas de interrogatório, tortura e expulsão de suas aldeias.

O Comitê destacou sua “profunda preocupação com relatos de que forças de segurança israelenses estão invadindo casas palestinas no meio da noite para deter crianças. (…) Ainda mais angustiantes são os relatos de que as crianças estão sendo submetidas a maus tratos, levadas aos tribunais militares e, muitas vezes, coagidas a assinar confissões.”

A visita de nove dias do Comitê Especial de Investigação à região também incluiu reuniões em Amã (Jordânia), onde esteve com vítimas, testemunhas e funcionários que trabalham com direitos humanos na Cisjordânia e nas Colinas de Golã, na Síria. Uma preocupação frequentemente comunicada durante a visita relacionava-se à situação de prisioneiros palestinos em Israel: as restrições de Israel às visitas familiares; a negação do direito à educação nos últimos meses; as más condições de detenção; a falta de atenção médica adequada; a detenção prolongada sem acusação; além de maus-tratos e torturas durante a detenção.

O Comitê expressou pesar pelo fato de o Governo de Israel não ter respondido ao seu pedido para visitar os territórios ocupados. Durante a 66ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em novembro de 2011, O Comitê Especial fornecerá um relatório aprofundado de suas observações após a missão e fará recomendações detalhadas para melhorar o respeito pelos direitos humanos nos territórios ocupados por Israel desde 1967.

O Comitê Especial foi criado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1968 para investigar práticas israelenses que afetam os direitos humanos do povo palestino e outros árabes dos territórios ocupados desde 1967. Seu mandato foi renovado em janeiro de 2011. Ele é composto por três Estados-Membros que este ano são representados pelo Embaixador Palitha Kohona, Representante Permanente do Sri Lanka na ONU em Nova York; pelo Embaixador Hussein Haniff, Representante Permanente de Portugal na ONU em NovaYork; e pelo Embaixador Fodé Seck , Representante Permanente do Senegal na ONU em Genebra.

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